segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A Lacuna (Barbara Kingsolver)

Esta é a história de Harrison William Shepherd, filho de uma mãe mexicana e de um pai americano. O pai é indiferente ao rapaz, enquanto a sua mãe deseja viver novos romances e aventuras, pelo que ela regressa ao México levando o filho.
O livro é escrito sob a forma de um diário da vida de Harrison, a partir das suas memórias remotas. E transporta-nos pelos detalhes da sua vida no México, onde através de toda uma sucessão de eventos ele torna-se no cozinheiro de Frida Kahlo e Diego Rivera. Mais tarde conhece Leon Trotsky, exilado do regime estalinista. A vida de Harrison entrelaça-se com a vida de estes personagens históricos, o que torna a leitura ainda mais fascinante.
Já mais adulto, ele acaba por regressar à América onde os seus livros sobre história mexicana tornam-se campeões de vendas. Todavia, a Comissão contra Actividades Anti-Americanas é iniciada pelo Senado e ele é chamado a depor, uma vez que acreditam que possa ser um membro do Partido Comunista, o que lhe traz uma enorme sensação de angústia, dado que sempre foi um cidadão privado e o conduz à decisão de como o livro terminará.
Por vezes parece-nos que Harrison Shepherd é mais um observador passivo do que um participante activo da sua própria vida. Com todos os outros personagens tão fortes, tão vincados, cada um uma perspectiva decidida e intransigente em relação à maioria dos assuntos, Harrison serve de certa forma de contraponto: ele escuta e observa, absorve tudo e exala as suas impressões no que escreve em diários e romances. Quando Harrison pede à sua secretária para queimar um diário da sua infância ele divaga para consigo: “Um rapaz invisível tornado real, visto por uma só vez outros olhos, mesmo que só por um vislumbre. Uma cidade de memórias consumida em chamas e gás, e em relação à qual não podemos ter quaisquer remorsos.” Nestas palavras Shepherd revela a sua natureza.
É uma leitura apaixonante quer pela própria história, quer pelo facto de por vezes não sabermos exactamente quem está a relatá-la. A descrição da vida na casa de Kahlo e Rivera, assim como a personalidade de Trotsky e a sua mulher tornam-na particularmente cativante para nós. E acabamos por ter vislumbres inesperados sobre a história e a cultura mexicana, um pouco afastados dos lugares comuns aos quais estamos habituados. Esta obra já foi uma outra vez referenciada pelo facto de ser dito que a autora tinha uma agenda política por detrás dela. Nós discordamos, parece-nos que este romance apesar de se centrar em torna da política, é sobre pessoas, ela não deifica o socialismo, nem o comunismo, nem o anti-comunismo, nem o capitalismo, mas como as pessoas transportam a sua vida e transportam-se para essas correntes. Faz-nos desejar aprender mais sobre todas essas nuances em confronto e conhecer as motivações daqueles que não conhecemos ou que têm visões do mundo diferentes da nossa, o que acaba por ser uma mensagem reiterada na obra.
É um livro de escrita minuciosa. Os mais pequenos detalhes acabam por se tornar importantes. É uma história que toma o seu tempo para ser relatada e a enorme e ambiciosa empresa a que este livro se dedica, a integração sem mácula do material histórico com toda a imagética e motivos literários na narrativa, tornam esta obra imensamente impressionante a qualquer nível.





Autor: Barbara Kingsolver


Editora: Clube do Autor


Páginas: 494


Género: Romance

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