segunda-feira, 18 de agosto de 2014

A Amante do Papa (Jeanne Kalogridis)

Um dos aspectos que mais rapidamente me captou a atenção foi o facto da sua narrativa ter como ponto de vista a aia de Catarina Sforza sem que ela sirva apenas como receptora dos desabafos da sua dama.
Tendo a sua própria história, o mistério da morte do seu marido que ela tentará resolver, Dea acaba por ser mais do que uma voz, é uma personagem condutora da narrativa e de muitas desobertas acerca da sua época.
Várias dessas descobertas do submundo do mundo por onde se move Catarina Sforza, mas acontecendo sempre em paralelo entre as duas mulheres.
Ambas têm aspectos de vida similares - o assassínio dos maridos de ambas, por exemplo - mas a autora reforça isso com o padrão de leitura das Cartas da Sorte que é coincidente entre as duas.
Assim ligadas, Dea será mais do que testemunha da vida de Catarina, contribuirá para as suas tomadas de decisão.
Admirando-a profundamente e querendo protegê-la, Dea usará ao máximo as suas capacidades, até vendo-as colocarem-se em confronto com a sua herança católica.
A autora tomou muitas liberdades históricas, em grande parte com o forte pendor místico que rege as duas mulheres protagonistas do livro e com a magia na mão de alguns elementos à sua volta.
Reconhecendo e aceitando essas liberdades ficcionais o que encontramos para além disso é uma descrição muito vívida da realidade do século XV Italiano.
Uma descrição sem medo da sua crueldade e dureza, usando-a muitas vezes como demonstração dos males, maioritariamente masculinos, que Catarina Sforza teve de enfrentar e que a levaram a moldar a sua personalidade de política e estratega ao nível feroz como o fez.
Nesse cenário ela insere um enorme conjunto de personagens intensas. Nem todas serão admiradas, nem naquele período da Renascença tal seria possível, mas nenhuma ficará esquecida pelo leitor.
Do jogo sangrento da política entre Sforza, Médici e Bórgia só pode resultar um envolvimento de leitura intensa.
Os estratagemas políticos que eram, afinal, parte subjacente a todas as decisões de vida de Catarina Sforza são o que nos convence de que estamos a ler uma história no coração da História.
Mesmo se, desta vez, há mais lugar à invenção do que o habitual.





Autor: Jeanne Kalogridis


Editora: Planeta Manuscrito


Páginas: 464


Género: Romance Histórico

domingo, 17 de agosto de 2014

Cine-Literatura

Na passada quinta-feira estreou o filme A Viagem dos Cem Passos que eu já tive oportunidade de ver e de que gostei bastante.
O livro que lhe deu origem já tinha sido publicado entre nós em 2011, pela Dom Quixote, mas sinceramente nunca me tinha chamado a atenção.
O bom de uma adaptação é isso mesmo, voltar a chamar a atenção para um livro, embora pelo contrário ver o filme sem ter lido o livro me torne um pouco avessa a vir a fazê-lo de todo.
É mais fácil ver um filme baseado num livro do que o seu contrário, na minha opinião, simplesmente porque o filme já molda algumas ideias que não se conseguem depois afastar das páginas escritas - a cara de Helen Mirren, por exemplo.
De qualquer maneira, o livro está aí com uma capa nova, relativa ao filme, muito embora até prefira a antiga capa!






Outro filme directamente relacionado com literatura é Tar, inspirado na poesia de C. K. Williams.
Embora o género de filme não me atraia, fiquei interessada na obra deste vencedor de um Pulitzer que parece não ter sido editado em Portugal.
Encontrei a sua TED Talk "Poetry of youth and age" já de 2001 onde ele lê slguns dos seus poemas.
Acho que há algo de muito mais intenso quando um poeta lê a sua própria obra, como se tivéssemos acesso à essência da mesma que só ele conhece.
Podem visioná-la ou fazer o seu download seguindo este link.
E deixo-vos com a transcrição do poema que dá nome ao filme.




Tar
The first morning of Three Mile Island: those first disquieting, uncertain,   
          mystifying hours.
All morning a crew of workmen have been tearing the old decrepit roof
          off our building,
and all morning, trying to distract myself, I’ve been wandering out to 
          watch them
as they hack away the leaden layers of asbestos paper and disassemble 
          the disintegrating drains.
After half a night of listening to the news, wondering how to know a 
          hundred miles downwind
if and when to make a run for it and where, then a coming bolt awake 
          at seven
when the roofers we’ve been waiting for since winter sent their ladders 
          shrieking up our wall,
we still know less than nothing: the utility company continues making 
          little of the accident,
the slick federal spokesmen still have their evasions in some semblance 
          of order.
Surely we suspect now we’re being lied to, but in the meantime, there 
          are the roofers,
setting winch-frames, sledging rounds of tar apart, and there I am, on 
          the curb across, gawking.

I never realized what brutal work it is, how matter-of-factly and harrow-
          ingly dangerous.
The ladders flex and quiver, things skid from the edge, the materials are 
          bulky and recalcitrant.
When the rusty, antique nails are levered out, their heads pull off; the 
          underroofing crumbles.
Even the battered little furnace, roaring along as patient as a donkey, 
          chokes and clogs,
a dense, malignant smoke shoots up, and someone has to fiddle with a 
          cock, then hammer it,
before the gush and stench will deintensify, the dark, Dantean broth 
          wearily subside.
In its crucible, the stuff looks bland, like licorice, spill it, though, on 
          your boots or coveralls,
it sears, and everything is permeated with it, the furnace gunked with 
          burst and half-burst bubbles,
the men themselves so completely slashed and mucked they seem almost 
          from another realm, like trolls.
When they take their break, they leave their brooms standing at attention 
          in the asphalt pails,
work gloves clinging like Br’er Rabbit to the bitten shafts, and they slouch 
          along the precipitous lip,
the enormous sky behind them, the heavy noontime air alive with shim-
          mers and mirages.

Sometime in the afternoon I had to go inside: the advent of our vigil was 
          upon us.
However much we didn’t want to, however little we would do about it, 
          we’d understood:
we were going to perish of all this, if not now, then soon, if not soon, 
          then someday.
Someday, some final generation, hysterically aswarm beneath an at-
          mosphere as unrelenting as rock,
would rue us all, anathematize our earthly comforts, curse our surfeits 
          and submissions.
I think I know, though I might rather not, why my roofers stay so clear 
          to me and why the rest, 
the terror of that time, the reflexive disbelief and distancing, all we should 
          hold on to, dims so.
I remember the president in his absurd protective booties, looking 
          absolutely unafraid, the fool.
I remember a woman on the front page glaring across the misty Sus-
          quehanna at those looming stacks.
But, more vividly, the men, silvered with glitter from the shingles, cling-
          ing like starlings beneath the eaves.
Even the leftover carats of tar in the gutter, so black they seemed to suck 
          the light out of the air.
By nightfall kids had come across them: every sidewalk on the block was 
          scribbled with obscenities and hearts.

domingo, 3 de agosto de 2014

O Bibliotecário (A.M. Dean)

Para mim um dos pontos mais interessantes d'O Bibliotecário é o facto de ser protagonizado por uma mulher.
Uma mulher jovem e atraente mas com uma carreira académica. Certamente que são raras as protagonistas neste género de conspiração que envolve muita aventura masculinizada.
Aqui também é o cérebro que prevalece, já que história exige mais da memória e da inteligência da protagonista do que das suas capacidades físicas.
Essa opção também ajuda a equilibrar um pouco a forma como o livro - e, em geral, todos os thrillers deste género - vai criando algumas situações impossíveis.
Essas situações é que levam os protagonistas à volta do mundo a conhecer e a dar a conhecer ao leitor locais extraordinários.
Nesse aspecto, as descrições dos vários lugares por onde passa a acção, sobretudo a moderna Bibioteca de Alexandria, são muito fortes, conpletas e vívidas.
Ainda mais fortes são os relatos históricos dos acontecimentos que afectaram a biblioteca original, dos relatos que se relacionam com os livros que dela desapareceram para depois serem avistados.
Esses são, sem sombra de dúvida, os pedaços mais excitantes deste livro, pois a História tem maravilhas que a imaginação não consegue atingir.
A inclusão da História na história enriquece-a e acaba por servir como segunda linha do livro que, além de uma aventura entretida, reflecte sobre o poder que os livros guardam e de como se pode confiar em quem controla o seu conhecimento.
Trazendo a Biblioteca de Alexandria das suas origens antigas à realidade de um mundo digital, o autor dá-nos um livro que deixa uma marca para além da leitura mais superficial.
E num reparo final, é um livro cheio de informação mas nem por isso demasiado longo ou com um ritmo lento. Será, por isso, capaz de satisfazer muitos públicos diferentes de maneira igual.




Autor: A.M. Dean


Editora: Clube do Autor


Páginas: 404


Género: Thriller

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Cine-Literatura

Esta semana estrearam nas salas portuguesas dois filmes baseados em livros já editados em Portugal. Ambos exemplos da literatura nórdica mas em géneros muitos diferentes.

O Guardião das Causas Perdidas do Dinamarquês Jussi Adler-Olsen beneficiará do efeito de prolongado sucesso em torno dos policiais chegados daquela zona da Europa.
Numa edição muito recente da Editorial Presença, acho que o filme chamará atenção para o livro e vice-versa.

Já O centenário que fugiu pela janela e desapareceu é uma edição de 2011 da Porto Editora e um livro que faz parte do Plano Nacional de Leitura.
Um livro de humor (negro) do Sueco Jonas Jonasson que não beneficiará muito de uma estreia muito discreta do filme.

Não tendo lido nenhum dos dois, confesso que para já estou mais interessada em ler o livro de Jonas Jonasson e em ver o filme baseado no livro de Jussi Adler-Olsen.
Sobretudo porque o efeito de ver o filme antes estraga um pouco o livro e o de Jonas Jonasson já está na minha lista há algum tempo e o filme volta, em boa hora, a chamar a atenção para ele.
E porque duvido que chegue a ler o policial, género que funciona melhor, para mim, no grande ecrã.






Carl Mørck não é o detetive mais popular da Divisão dos Homicídios de Copenhaga. Por isso, quando é criado o Departamento Q, com a missão de rever casos arquivados, Carl Mørck é designado para o dirigir.
O seu primeiro caso é o de Merete Lynggaard, uma deputada que desaparecera cinco anos antes sem que a polícia conseguisse mais do que conjeturar uma aparente tentativa de suicídio.
Toda a gente acha que ela está morta. Toda a gente diz que investigar o sucedido é uma perda de tempo. Mas, à medida que Carl Mørck começa a seguir as pistas que o seu colega havia descartado aquando da investigação inicial, descobre um caso com contornos inesperados e profundamente sinistros...








No dia em que Allan Karlsson celebra 100 anos, toda a cidade o aguarda para uma grande festa em sua honra. 
Mas Allan tem outros planos… Morrer de velho? Sim, mas não ali!
Munido de um par de chinelos gastos, joelhos empenados e uma ousadia tremenda, Allan lança-se numa extraordinária aventura, arrastado numa torrente de equívocos e golpes de sorte.
E ao mesmo tempo que acompanhamos a sua última viagem (ou será que não?), conhecemos o seu passado, perdido entre guerras, explosões e mulheres fatais – qual delas a mais perigosa!
Uma estreia literária impressionante que conquistou centenas de milhares de fãs.